terça-feira, 25 de junho de 2019

Poesia popular Nordestina ou brasileira?



Muitos confundem literatura de cordel ou poesia popular com manifestações poéticas nordestinas. Há um fundo de verdade nisso, mas é bom lembrar de que há poesia popular em todo o Brasil (e, seguramente, em toda a América Latina). A literatura de cordel significa a parte impressa e, como tal, representa menos do que 1% da poesia realmente feita a nível popular, mas que é apenas cantada por violeiros, trovadores ou cantadores.      



Até fins do século passado, havia poesia popular regularmente manifestada em todo o Brasil. A maior parte da população era rural e, logicamente, devido ás distancias, o entrosamento era muito pequeno, ainda mais, tendo-se em vista os sistemas de comunicação de massa de nossos dias. As diferenças de expressão regional eram muito grandes e a poesia também. O padrão linguístico da elite brasileira ainda era o de Coimbra ou Lisboa e o povo se expressava como bem podia.
Houve dois acontecimentos, a partir do Segundo Império, que modificaram boa parte da cultura popular brasileira e, em particular, a poesia. Um deles foi a imigração europeia no Sul do país, que introduziu muitos moldes diferentes em detrimento dos que já existiam no local. Outro foi a grande expansão nordestina para todas as áreas amazônicas por ocasião do Ciclo da Borracha. Hoje em dia, pode-se dizer que todos os rios que correm para a Bacia Amazônica são habitados por nordestinos e descendentes e, assim, temos expressão poética regional nordestina em todas essas regiões.
Existem ainda alguns redutos de poesia popular fora do pólo nordestino. Um é o antigo caminho dos bandeirantes – de São Paulo via vale do Tietê até as regiões de Goiás Velho e Cuiabá. Todos esses lugares, que incluem Piracicaba, Sorocaba, Itu etc.  são centros de cultura caipira, e aí encontramos modalidades de poesia popular como cururu, fandango, batuque, cana-verde, samba e jongo. A mais conhecida é o cururu, com seus infindáveis desafios em que se tem de marcar tempo para cada cantador. Há predeterminação de tema e rima antes de se iniciar o debate poético. No Sul de Minas no vale do Paraíba temos o “calango”, um desafio improvisado muito rápido, mas, também, apenas oral.
Há um grande reduto poético popular no Rio Grande do Sul, sobretudo na região da fronteira. Lá as poesias geralmente se apresentam em forma de trova(estrofes de quatro versos, cada um com sete sílabas). Embora a produção seja essencialmente oral, há muitos poetas sendo divulgados através de coletâneas regularmente impressas. Em quase todos os municípios do Rio Grande há pelo menos um CTG (Centro de Tradição Gaúcha), entidades semi-oficiais que cuidam da preservação da cultura popular e, consequentemente, da poesia também.
No resto do país, assistimos a um avanço poderoso da poesia nordestina. Com a vinda de migrantes para o Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília, a cultura nordestina está se tornando sinônimo de cultura popular brasileira. Pudera. Só na grande São Paulo existem cinco milhões de nordestinos e descendentes. Além disso, a poesia popular possui um grande triunfo: o hábito de imprimir seus poemas mais representativos. E assim, temos a literatura de cordel, hoje, símbolo no mundo todo da cultura popular do povo brasileiro. A sextilha nordestina (estrofes de seis versos de sete sílabas) tornou-se a maior expressão poética de toda a nossa história.

Fonte: LUYTEN, Joseph Maria. O que é literatura popular. 2. Ed. São Paulo: Brasiliense, 1983.73. p (Coleção primeiros passos)


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