sexta-feira, 25 de outubro de 2019

As origens da Literatura Popular


Sempre me contaram que todas ações humanas tinham seus principios registrados nas antigas cavernas dos trogloditas ou, então nos hieróglifos dos antigos egípcios. Forçando um pouco os fatos, isso até pode ter um vislumbre de verdade. Na realidade, porém, o que acontece é que os pesquisadores modernos tendem a considerar as ações dos antigos sob o prisma, o ponto de vista do nosso século. Assim, por exemplo, ao analisar a democracia grega, ela nos pode ser apresentada como um exemplo para hoje em dia. Um exame mais cuidadoso, porém, vai revelar que ela se baseava sobre trabalho escravo. é muito fácil discutir-se sobre a igualdade de uma camada populacional entre si, quando estas pessoas nada fazem para sua própria subsistência. 
A literatura popular aparece no Ocidente em duas etapas. A primeira é a partir do século XII, como manifestação leiga independente do sistema de comunicação eclesiástico. Ela se caracteriza sobretudo por ser uma linguagem regional e não em latim, que naquela época era a língua oficial de toda Europa cristã. Aos poucos, porém, as pessoas do povo iam contando suas histórias e compondo seus versos, de forma primitiva. Mas não havia outro jeito, pois toda a comunicação anterior oficial era em latim e tratava de assuntos eruditos ou religiosos. Naqueles tempos, as pessoas não podiam sair de seus feudos, seus lugares de origem. Havia somente duas ocasiões em que isso era possível: em época de guerra ou em peregrinação. 
Havia na Europa medieval três pontos de peregrinação famosos: Roma - a Santa Sé - Jerusalém - a Terra Santa - e Santiago de Compostela, que ficava ao Norte da Espanha, a Galícia, e que era o lugar onde se dizia ter sido enterrado o apóstolo Santiago. Santiago de Compostela era tão famosa que, durante a Idade Média, a própria Via Láctea - como ela fazia uma curva para o sudoeste (do ponto de vista norte-europeu) - era chamada de Caminho de Santiago. Houve, em consequência dessas movimentações populares, três focos de convergência humana. Um era o Sul da França, a Provence, onde se reuniam as pessoas entes de atravessar o mar Mediterrâneo, para chegar à Palestina, geralmente em mãos árabes. Outro era o Norte da Itália, a Lombardia, por onde se tinha de passar para chegar a Roma. E o terceiro era a Galícia, o único lugar da península ibérica não tomado pelos sarracenos e onde ficava o santuário de Santiago.
É exatamente nesses três lugares onde começa a literatura popular, onde se concentravam poetas nômades (entre as raras pessoas que tinham locomoção livre) e que funcionavam como verdadeiros jornalistas, contando as novidades e cantando poemas de aventura e braveza.
Notamos, então, que a literatura popular medieval é uma oposição à oficial da Igreja Católica. Ao passar dos anos, ela vai se fortalecendo e dá lugar a focos de línguas nacionais como o italiano, o francês provençal e o português-galaico. Aliás, até hoje, há dúvidas sobre qual a primeira língua nacional da península ibérica - se o português ou o espanhol. Ambos se originam do galaico - que existe até hoje, como dialeto, tanto em Portugal como na Espanha. Mais tarde, vão surgir outras línguas nacionais, ao longo dos grandes rios europeus como o Reno e o Danúbio e, posteriormente, ao Norte da Europa e na Inglaterra. 
O que importa para nós é que esses núcleos vão tornar-se fontes de produção de cultura regional, transportada para o resto da Europa, por intermédios dos menestréis, trovadores e jograis, três categorias de poetas andarilhos. 


Fonte: LUYTEN, Joseph Maria. O que é literatura popular. 2. Ed. São Paulo: Brasiliense, 1983.73. p (Coleção primeiros passos)








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